Em maio do ano passado, uma operação da Polícia Federal apresentou a cadeia a Zuleido Veras, dono da construtora Gautama, um conhecido parasita de obras públicas. Escutas telefônicas e documentos apreendidos revelaram que o empreiteiro, agora solto, mantinha uma extensa relação de contratos milionários – e incestuosos – com o governo federal e uma intensa relação – também incestuosa – com políticos de vários estados e matizes. As investigações levaram o Ministério Público a acusar 61 pessoas por crimes de corrupção e formação de quadrilha, entre elas o ex-ministro de Minas e Energia Silas Rondeau e os governadores Teotonio Vilela Filho, de Alagoas, e Jackson Lago, do Maranhão. Os laços financeiros que uniam Zuleido a políticos, porém, parecem ser bem mais fortes do que se imaginava. Em uma das buscas realizadas no escritório do empreiteiro, a polícia recolheu agendas com informações intrigantes que devem arrastar muita gente graúda para o epicentro do escândalo. VEJA teve acesso ao conteúdo dos registros. As anotações sugerem que Zuleido Veras mantinha uma contabilidade clandestina que alimentava desde campanhas eleitorais até pagamentos de propinas a funcionários públicos e políticos.
As agendas apreendidas mostram a rotina do empreiteiro nos anos de 2005, 2006 e 2007. Elas revelam um Zuleido que se movimentava em Brasília com enorme desenvoltura. Ele visitava políticos no Congresso, freqüentava os gabinetes de importantes dirigentes de empresas estatais, encontrava-se com lobistas e mantinha relações estreitas com alguns jornalistas. As anotações também revelam que ele gosta de números – ou melhor, de cifras. Em 2006, ano de campanha eleitoral, as andanças de Zuleido se intensificaram e seus apontamentos deixam evidente que os contatos não se limitavam apenas a interesses comerciais. Em uma anotação, datada de 14 de julho de 2006, ele organiza o que parece ser uma tabela de "contribuições" a campanhas políticas. O Maranhão aparece como recebedor de 1 milhão; Alagoas, de 500.000; e o Tocantins, de 200.000. Pernambuco ficaria com 2% de uma quantia não especificada. Zuleido ainda relaciona nomes de políticos a cifras. Para a Bahia, os nomes "Jutahy" e "Imbassahy" aparecem ao lado do número 100. Há dois políticos baianos que foram candidatos em 2006: Jutahy Junior e Antonio Imbassahy. O Rio de Janeiro está registrado com um sinal de interrogação ao lado do nome "Cabral", possivelmente Sérgio Cabral, então candidato ao governo fluminense. Na mesma página, Zuleido escreve o nome "Lula" com uma interrogação ao lado. O presidente Lula disputava a reeleição.
Em 16 de agosto de 2006, a agenda lista autoridades que teriam recebido dinheiro de Zuleido. O nome da candidata derrotada ao governo do Maranhão, Roseana Sarney, aparece ao lado da cifra de 200 000 reais. Ela nega ter recebido qualquer tipo de ajuda do empreiteiro
A agenda de Zuleido contém uma lista extensa de nomes associados a números. Alguns desses nomes, ao que tudo indica, são de obras públicas executadas pela Gautama nas quais a Controladoria-Geral da União já identificou superfaturamento. "Pratagy", por exemplo, seria uma referência à obra de ampliação do sistema de abastecimento de água do Rio Pratagy, em Maceió, Alagoas. Na agenda de Zuleido, o nome vem acompanhado do número 100. Só nessa obra pública os auditores da CGU calculam que o prejuízo aos cofres públicos pode chegar a 11,7 milhões de reais. Da agenda consta o nome "São Francisco" associado ao número 30. Segundo a Polícia Federal, seria uma referência ao projeto de transposição do Rio São Francisco, orçado em 5,2 bilhões de reais e para o qual a Gautama foi pré-classificada. Na agenda figuram ainda outras obras, como uma "BR-BID", associada ao número 50, e "Aeroporto MA", com o número 25. A Gautama foi a empreiteira responsável pela ampliação do Aeroporto Internacional de Macapá, investigada por desvios de 52 milhões de reais nas obras.
Na agenda de 2006 de Zuleido, aparece várias vezes o nome do ex-deputado Luiz Piauhylino (PDT-PE). Numa delas, sob o registro "Pagamentos", o sobrenome do deputado está escrito antes de "20". Em 27 de outubro, há a anotação "Infraero", seguida de dois nomes e valores: "Olavo – R$ 50 000,00 e Reis – R$ 30 000,00". Não há nenhum Olavo entre os dirigentes da Infraero. Já Reis, presume a PF, pode se referir a Josenvalto Reis de Souza, então assessor especial da presidência da empresa. Zuleido Veras também faz referências explícitas a pagamentos ao deputado federal João Carlos Bacelar Filho (PR-BA), supostamente presenteado com 100 000 reais. O deputado Paulo Magalhães (DEM-BA) teria recebido duas contribuições, de 50 000 reais cada uma. Datada do dia 1º de dezembro, consta a anotação "Tuma 50". Evidentemente, qualquer um pode ser citado na agenda de um vigarista, sem que isso signifique necessariamente que a pessoa faça parte de esquemas de corrupção e desvio de dinheiro público. Mas é recomendável não descartar com facilidade a frenética numerologia e a farta compilação de nomes de autoria do empreiteiro Zuleido Veras. Inclusive porque uma parte desse material já foi conectada a grampos da PF.
Em 12 de maio de 2007, aparece na agenda de Zuleido a anotação "reunião c/ o gov.". De acordo com a Polícia Federal, é uma referência ao governador do Maranhão, Jackson Lago (PDT), que teve dois sobrinhos presos e foi denunciado por corrupção pelo Ministério Público na Operação NavalhaFONTE:
Revista VEJA edição nº2066 que estará nas bancas em 26/06/2008
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